A penhora de criptomoedas tem se tornado uma questão relevante no âmbito jurídico, especialmente diante do aumento no uso de ativos digitais como forma de investimento.
Como bens economicamente valorizados, as criptomoedas podem ser objeto de penhora em processos de execução, mas sua natureza descentralizada e a ausência de regulamentação consolidada no Brasil trazem desafios específicos.
Neste artigo, abordaremos como funciona a penhora de criptomoedas, suas peculiaridades nos processos judiciais e ofereceremos dicas práticas para advogados que lidam com execuções envolvendo criptoativos.
Penhora de bens [Art. 835 do CPC]: Como funciona?
O que são criptomoedas?
Criptomoedas são ativos digitais baseados em tecnologia de blockchain, que oferece segurança e transparência às transações, mas sem a intermediação de instituições financeiras tradicionais.
Exemplos populares incluem Bitcoin, Ethereum e outras altcoins.
Diferentemente de bens móveis ou imóveis, as criptomoedas não possuem registro centralizado, sendo armazenadas em carteiras digitais que podem ser acessadas apenas com chaves privadas.
Essa característica gera complexidade em sua localização e apreensão judicial.
Veículo em nome de terceiros pode ser penhorado quando a posse é de executado
É possível a penhora de criptomoedas?
Sim, a penhora de criptomoedas segue um procedimento semelhante ao de outros bens penhoráveis, mas com particularidades devido à tecnologia blockchain.
Veja como funciona:
- Identificação dos ativos: o primeiro passo é localizar as criptomoedas do devedor. Isso pode ser feito por meio de ordem judicial para exchanges (plataformas de compra e venda de criptoativos), solicitando informações sobre contas registradas e saldos.
- Bloqueio de valores: após a identificação, o juiz pode determinar o bloqueio dos criptoativos nas exchanges, impedindo que o devedor movimente os valores.
- Conversão em moeda fiduciária: em alguns casos, as criptomoedas são convertidas em moeda corrente para facilitar a execução do crédito, considerando as variações de mercado.
- Execução da penhora: os valores obtidos são transferidos para a conta judicial ou diretamente ao credor, conforme determinação do juiz.
Base legal: Apesar da ausência de regulamentação específica no Brasil, o art. 835 do CPC estabelece que, em regra, todos os bens do devedor podem ser penhorados, o que inclui criptoativos.
Art. 835 CPC. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:
I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;
II – títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado;
III – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;
IV – veículos de via terrestre;
V – bens imóveis;
VI – bens móveis em geral;
VII – semoventes;
VIII – navios e aeronaves;
IX – ações e quotas de sociedades simples e empresárias;
X – percentual do faturamento de empresa devedora;
XI – pedras e metais preciosos;
XII – direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;
XIII – outros direitos.
Qual o prazo da penhora de criptomoedas?
A penhora de criptomoedas segue, em grande parte, as diretrizes do Código de Processo Civil (CPC), embora ainda dependa de interpretações jurisprudenciais.
O devedor tem o prazo de 5 dias úteis, conforme o art. 854, §3º do CPC, para apresentar impugnação ou alegar irregularidades relacionadas à penhora, sendo este prazo aplicado por analogia às criptomoedas, considerando sua natureza patrimonial.
Além disso, o cumprimento pode variar, especialmente no caso de exchanges internacionais ou não regulamentadas no Brasil, que frequentemente apresentam dificuldades operacionais ou legais para atender prontamente às ordens judiciais.
Assim, embora o procedimento ainda careça de uniformidade, as bases legais do CPC oferecem parâmetros gerais para a efetivação da penhora desses ativos.
Quais são os desafios na penhora de criptomoedas?
- Descentralização: diferente de contas bancárias, as carteiras digitais não têm um registro único ou centralizado, dificultando a localização dos ativos.
- Privacidade: muitos devedores utilizam carteiras externas (off-chain), fora do alcance das exchanges reguladas.
- Valorização volátil: o valor das criptomoedas oscila rapidamente, podendo gerar problemas na estimativa de valor penhorado.
- Sigilo e anonimato: a tecnologia blockchain garante certo nível de anonimato, dificultando a identificação do titular dos ativos.
- Falta de regulamentação específica: apesar de avanços como o PL 4.401/2021, que regula criptoativos no Brasil, ainda há lacunas legais que dificultam a execução.
Guia Completo do Arrolamento de Bens no CPC
Execução de penhora de criptomoedas: Dicas práticas para advogados
Veja a seguir as dicas práticas para advogados sobre a execução de penhora de criptomoedas.
Insira cláusulas específicas em contratos
Recomende que seus clientes insiram cláusulas em contratos prevendo expressamente a penhora de criptomoedas em caso de inadimplência.
Isso facilita a argumentação jurídica e demonstra intenção prévia das partes.
Identifique exchanges reguladas
Solicite ao juiz que envie ofícios às exchanges que atuam no Brasil, como Binance, Mercado Bitcoin ou outras registradas no Banco Central, para verificar a existência de criptoativos.
Utilize ferramentas de rastreamento
Para localizar criptoativos fora de exchanges reguladas, considere o uso de ferramentas especializadas de rastreamento de blockchain.
Essas soluções ajudam a mapear transações e identificar carteiras vinculadas ao devedor.
Solicite a transferência para uma carteira judicial
Peça ao juiz que os valores bloqueados sejam transferidos para uma carteira digital administrada pelo Poder Judiciário, garantindo a integridade dos ativos durante o processo.
Verifique a viabilidade econômica
Antes de iniciar o pedido de penhora, avalie se o valor estimado dos criptoativos justifica os custos operacionais e o tempo investido no procedimento.
Monitore continuamente as regulamentações
O mercado de criptoativos está em constante evolução. Fique atento a atualizações legislativas e jurisprudenciais que podem impactar a penhora de criptomoedas.
Acordos extrajudiciais
Em muitos casos, a possibilidade de penhora de criptoativos pode incentivar o devedor a buscar um acordo, evitando os custos e complicações de um processo de execução.
A importância do conhecimento técnico na penhora de criptomoedas
A penhora de criptomoedas é uma inovação no Direito que exige preparo técnico e estratégico dos advogados.
Apesar dos desafios, a crescente regulamentação dos criptoativos e o uso de tecnologia avançada estão tornando o processo mais viável e eficiente.
Manter-se atualizado sobre as mudanças legislativas e as melhores práticas é essencial para atuar com sucesso nesse campo, garantindo a proteção dos direitos do credor e a execução efetiva dos débitos.
Veja também outro artigo do nosso blog: Impenhorabilidade do bem de família [Lei nº 8.009/90]: Como funciona?