STJ: Prazo para anular ato doloso de procurador é de quatro anos

5 dez, 2025
STJ prazo para anular ato doloso de procurador é de 4 anos.

A anulação de negócios jurídicos praticados por procuradores (mandatários) é tema relevante  na prática civil, sobretudo quando há indícios de abuso de poderes, fraude ou conduta dolosa. 

Sobre esse tema, o STJ  definiu que, quando o procurador age com dolo e excede os poderes concedidos para obter vantagem própria, o prazo decadencial para buscar a anulação do ato é de quatro anos, contados da celebração do negócio. 

A partir dessa decisão, advogados passam a ter um parâmetro mais claro para orientar clientes em litígios que envolvem procurações, substabelecimentos e atos ilegítimos praticados contra a vontade manifesta ou presumível do mandante. 

O que aconteceu no caso concreto analisado pelo STJ? 

O caso envolveu uma procuradora que recebeu poderes para vender um imóvel e, ao invés de cumprir o mandato de boa-fé, substabeleceu a procuração e participou de uma operação destinada a transferir o bem para si mesma por preço irrisório de apenas um centavo. 

De acordo com os autos, a proprietária ajuizou ação declaratória buscando anular a escritura de compra e venda. O juízo de primeiro grau reconheceu a nulidade e aplicou o prazo decadencial de quatro anos. 

O Tribunal estadual, no entanto, reduziu o prazo para dois anos e ainda alterou o termo inicial para a data em que a proprietária tomou ciência do negócio. 

Ao apreciar o recurso especial, o STJ confirmou a nulidade da escritura e restabeleceu o prazo de quatro anos, deixando claro que o termo inicial deve ser a data da celebração do negócio jurídico, independentemente da ciência do mandante.

O que o STJ decidiu sobre o prazo para anular atos dolosos praticados por procuradores?

O STJ decidiu que o prazo para anular ato doloso praticado por procurador (também chamado de mandatário) é de quatro anos, contados a partir da celebração do negócio jurídico. 

O Tribunal concluiu que, quando o mandatário age com dolo e viola a confiança inerente ao contrato de mandato, a hipótese se enquadra no art. 178, inciso II, do Código Civil, afastando a aplicação do prazo bienal previsto no art. 179.

Portanto, a decisão reforça que o mandato é um contrato baseado em confiança recíproca e lealdade. 

Assim, se o procurador extrapola os poderes concedidos e pratica ato voltado a beneficiar a si próprio, em prejuízo do mandante, o ato passa a ser considerado um ilícito doloso que justifica a adoção do prazo decadencial mais amplo

A Corte também afastou o uso da teoria da actio nata nesses casos, esclarecendo que o termo inicial da decadência é o momento da celebração do ato, e não a data da ciência da lesão.

Segue a ementa do Acórdão:

EMENTA 

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA. OUTORGA DE PODERES PELO PROPRIETÁRIO PARA A VENDA DE BEM IMÓVEL. MANDATÁRIO SUBSTABELECE A TERCEIRO. DOLO NO EXERCÍCIO DO MANDATO. PREÇO ÍNFIMO. PRAZO DECADENCIAL DE QUATRO ANOS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. PREJUDICADO. 

I. HIPÓTESE EM EXAME 

1. Recurso especial interposto por mandatário, contra acórdão que confirmou a sentença para manter a nulidade da escritura de compra e venda. 

2. Recurso especial interposto em em 4/9/2024 .

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 5/2/2024 e concluso ao gabinete 

3. O propósito recursal consiste em decidir qual é o prazo decadencial para o ajuizamento de ação de anulação de negócio jurídico, no qual o mandatário cometeu atos ilícitos de gestão – com dolo – para auferir um bem que lhe foi confiado pelo mandante. 

III. RAZÕES DE DECIDIR 

4. Segundo a jurisprudência desta Corte, o contrato de mandato ostenta natureza personalíssima, celebrado, portanto, intuitu personae, tendo por substrato a indispensável relação de confiança e de lealdade existente entre mandante e mandatário. 

5. Na hipótese de o mandatário agir com dolo contra a vontade manifesta ou presumível do mandante, para auferir um bem que está encarregado, o prazo decadencial deverá ser de quatro anos, contados a partir da celebração do ato. 

6. No particular, (I) a sentença julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, para declarar a anulação do negócio jurídico de compra e venda, e estabeleceu a contagem do prazo decadencial em quatro anos, nos moldes do art. 178, II do CPC; (II) por sua vez, o acórdão recorrido confirmou a sentença em parte, para manter a anulação do negócio jurídico de compra e venda perante o Registro de Imóveis, e alterou o prazo decadencial para dois anos, nos moldes do art. 179 do CPC, porém alterou o termo inicial da contagem para a data em que a parte tomou conhecimento da compra e venda.

IV. DISPOSITIVO 

7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.

Leia aqui a íntegra do Acórdão.

Por que o STJ aplicou o prazo de quatro anos previsto no artigo 178, II, do Código Civil?

O STJ aplicou o prazo de quatro anos (previsto no art. 178, II do CC) porque entendeu que o ato praticado pelo mandatário com dolo não é mera irregularidade de representação, mas ato ilícito cometido dentro de uma relação contratual personalíssima. 

Isso porque o contrato de mandato pressupõe confiança e boa-fé equando o procurador o utiliza para se apropriar do bem, viola a essência da relação jurídica e comete ato que se aproxima da gestão de negócios ilícita.

A Corte destacou, também, que o art. 179 do Código Civil, que prevê prazo de dois anos para anulação de atos jurídicos quando a lei não dispõe de prazo específico, não se aplica a situações em que há dolo do mandatário. 

Como se trata de defeito relevante na formação da vontade, aplica-se o art. 178, II do CC que prevê quatro anos para vícios que envolvem intenção dolosa. 

Essa interpretação evita que atos gravíssimos, praticados com abuso de confiança, fiquem submetidos a um prazo mais curto de decadência.

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O que diferencia o dolo do procurador de um simples excesso de poderes?

O dolo do procurador se diferencia do simples excesso de poderes porque envolve intenção deliberada de prejudicar o mandante para obter vantagem própria. 

No excesso de poderes comum, o mandatário extrapola a autorização recebida, mas sem intenção de causar dano. No dolo, por outro lado, há manipulação consciente do mandato para produzir resultado ilícito.

A decisão do STJ demonstra que a presença do dolo atrai duas consequências jurídicas importantes:

  • O ato se aproxima de um ilícito civil e pode resultar na anulação com base no art. 178, II do CC;
  • A relação intuitu personae é rompida, porque o procurador trai a confiança que fundamenta o mandato.

O caso julgado pelo STJ mostra essa diferença com clareza, já que a mandatária substabeleceu poderes e, por meio de uma operação interna, comprou o bem imóvel da mandante por apenas um centavo, evidenciando intenção fraudulenta.

STJ Prazo para anular ato doloso de procurador é de quatro anos.

Como o STJ avaliou o termo inicial da contagem do prazo decadencial?

O STJ avaliou que o termo inicial do prazo decadencial é a data da celebração do negócio jurídico e não a data em que o mandante tomou conhecimento do ato. 

Essa conclusão se fundamenta na natureza do prazo decadencial, que não se submete à teoria da actio nata.

O Tribunal esclareceu que, enquanto os prazos prescricionais se relacionam à pretensão resistida e dependem do conhecimento do dano, os prazos decadenciais ligados à anulação de negócios jurídicos se iniciam no ato em si. 

Assim, pouco importa quando o mandante descobriu a fraude. O fato gerador da decadência é a prática do ato doloso.

Essa interpretação foi decisiva para o desfecho do caso, pois o Tribunal de origem havia considerado dois anos e contado o prazo a partir da data da ciência.

Quais características do contrato de mandato explicam a aplicação do prazo decadencial maior?

A aplicação do prazo decadencial maior decorre das características do contrato de mandato, especialmente sua natureza personalíssima e a confiança que o cerca. 

O mandato é um negócio intuitu personae, ou seja, firmado em razão das qualidades pessoais do mandatário. O STJ ressaltou alguns elementos essenciais:

  • A confiança é pressuposto indispensável para o mandato.
  • O mandatário não pode se apropriar do bem cuja alienação ou administração lhe foi atribuída.
  • Atos praticados em desacordo com os poderes outorgados são ineficazes sem ratificação.
  • A violação dolosa da confiança gera ato ilícito e não simples irregularidade.

Essas características tornam a infração mais grave, justificando prazo decadencial mais amplo para garantir a proteção do mandante e a higidez dos negócios jurídicos.

Em quais situações esse entendimento do STJ poderá orientar futuros litígios?

Esse entendimento poderá orientar futuros litígios em todas as situações em que procuradores, representantes ou mandatários agirem comprovadamente com intenção de lesar o mandante

São exemplos comuns:

  • Venda de imóvel por procuração com preço irrisório.
  • Substabelecimento irregular destinado a propiciar vantagem ao procurador.
  • Transferência indevida de bens móveis ou valores.
  • Utilização da procuração para operações alheias ao interesse do mandante.
  • Manipulação de negócios familiares, sobretudo em separações e dissoluções patrimoniais.

Esses casos exigem análise da intenção do mandatário e da compatibilidade do ato com os poderes concedidos, o que reforça a importância da decisão como guia jurisprudencial.

Que impactos práticos essa decisão traz para advogados e partes envolvidas?

A decisão traz impactos práticos relevantes porque estabelece com clareza qual prazo processual deve ser observado. 

Isso permite que advogados atuem com maior segurança em casos que envolvem procurações, substabelecimentos e alienações suspeitas em contratos de mandato.

Do ponto de vista prático, o entendimento produz os seguintes reflexos em situações envolvendo contratos de mandato:

  • Amplia o prazo para buscar anulação, garantindo margem razoável para investigação do ato.
  • Reduz discussões nos tribunais sobre aplicação do art. 179 do CC quando há dolo.
  • Reforça que casos dolosos exigem análise minuciosa dos elementos de má-fé.
  • Exige que advogados avaliem com atenção a data exata da celebração do negócio para evitar perda do prazo decadencial.
  • Alerta mandatários e representantes sobre as consequências severas do abuso de poderes.

A decisão reafirma a importância do respeito à boa-fé e à confiança nas relações de mandato.

Como a decisão se relaciona com a tutela da boa-fé e da segurança jurídica?

A decisão se relaciona diretamente com a tutela da boa-fé e da segurança jurídica, pois protege o mandante de condutas fraudulentas e reforça a necessidade de integridade nos atos praticados por procuradores. 

O STJ sinaliza que não tolera desvios dolosos no exercício do mandato e que o sistema jurídico fornece mecanismos suficientes para anular tais atos.

Ao mesmo tempo, a definição clara do prazo de quatro anos valoriza a segurança jurídica ao uniformizar a interpretação nos tribunais. 

Situações semelhantes deixam de ser analisadas com critérios distintos, o que reduz incertezas e favorece a previsibilidade das relações patrimoniais.

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Sobre o autor

Micaela Sanches

Micaela Sanches

Bacharel em Direito, com especializações em Comunicação e Jornalismo, além de Direito Ambiental e Direito Administrativo. Graduanda em Publicidade e Propaganda, uma das minhas paixões. Amo escrever e aprender sobre diversos assuntos.

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