No recente julgamento do Conflito de Competência n. 211.941/PR, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) enfrentou uma questão prática comum, mas ainda cercada de dúvidas: em qual jurisdição deve tramitar uma ação de usucapião quando a posse teve origem em vínculo de trabalho?
Neste artigo, explicamos a tese fixada, os fundamentos do STJ e os impactos diretos para quem atua com ações possessórias, regularização fundiária e litígios patrimoniais envolvendo antigos empregados ou prestadores de serviços.
Justiça comum julga usucapião mesmo com posse originada em vínculo empregatício, decide STJ.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento importante sobre a competência para ações de usucapião: mesmo que a posse tenha origem em um antigo vínculo de trabalho, cabe à Justiça Comum Estadual julgar o caso e não à Justiça do Trabalho.
Para pacificar essa questão, o STJ julgou o Conflito de Competência nº 211.941/PR, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, em sessão da Segunda Seção, realizada em 05/06/2025, com publicação no Diário da Justiça Eletrônico Nacional (DJEN) em 10/06/2025.
No caso, o autor da ação de usucapião alegava exercer posse sobre um imóvel anteriormente vinculado a uma relação de trabalho já encerrada. O juízo cível declinou da competência para a Justiça do Trabalho, entendendo que a origem da posse se ligava ao contrato laboral.
No entanto, o STJ alterou o entendimento e firmou tese clara e objetiva, assegurando que ações de usucapião devem tramitar na Justiça Comum, quando o vínculo empregatício já se encontra extinto no momento da propositura da ação.
Tese firmada:
“Compete à Justiça Comum Estadual (e não à Justiça do Trabalho) o julgamento de ação de usucapião de bem imóvel em que a posse exercida pela parte usucapiente supostamente decorre de vínculo empregatício já extinto à época do ajuizamento.”
Segue a ementa abaixo:
EMENTA DO JULGADO: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL E JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO DE USUCAPIÃO. AUSÊNCIA DE DISCUSSÃO A RESPEITO DE RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL.
I. HIPÓTESE EM EXAME
- Conflito de competência entre o Juízo de Direito da Vara Cível de Pinhais – PR e o Juízo do Trabalho de Pinhais – PR, originado em ação de usucapião.
- Na hipótese, o conflito de competência instaurou-se em razão do vínculo empregatício mantido pelas partes anteriormente ao ajuizamento da ação de usucapião, que levou o juízo comum a declinar da competência ao juízo laboral.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
3. A questão em discussão consiste em definir se a Justiça do Trabalho é ou não competente para o julgamento de ação de usucapião de bem imóvel em que a posse exercida pela parte usucapiente supostamente decorre de vínculo empregatício já extinto à época do ajuizamento.
III. RAZÕES DE DECIDIR
4. Na ação de usucapião que tem por objeto bem imóvel, o essencial corresponde à prova da posse qualificada pelo lapso temporal exigido em lei para a respectiva modalidade de usucapião. A relação jurídica que subjaz ao exercício da posse pela parte usucapiente é relevante, na medida em que pode conduzir, a depender das circunstâncias concretas, ao julgamento de improcedência do pedido, se, por meio dela, houver a descaracterização do animus domini.
5. Limitando-se a pretensão à declaração de domínio, sem que a discussão esteja especificamente relacionada ao vínculo empregatício e à míngua de qualquer outra situação que poderia atrair a competência da justiça especializada, deve a ação tramitar no juízo cível comum.
IV. DISPOSITIVO
6. Conflito de competência conhecido. Declarada a competência do Juízo de Direito da Vara Cível de Pinhais – PR.
Processo: CC 211.941/PR
Classe: Conflito de Competência – 2025/0081492-9
Relatora: Ministra Nancy Andrighi (1118)
Órgão Julgador: S2 – Segunda Seção
Data do Julgamento: 05/06/2025
Data da Publicação/Fonte: DJEN 10/06/2025

Por que essa decisão é relevante para a prática jurídica?
Previne nulidades processuais
Evita o risco de anulação da ação por incompetência absoluta, assegurando que a demanda tramite desde o início no juízo correto, o que poupa tempo, recursos e retrabalho para advogados e partes envolvidas.
Reafirma a natureza civil da usucapião
Mesmo quando a posse teve origem em relação de trabalho, a decisão do STJ reforça que o objeto central da ação é o domínio do bem, e não a relação empregatícia, afastando interpretações equivocadas que desviam o processo para a Justiça do Trabalho.
Proporciona segurança jurídica e estratégica
Ao delimitar com clareza a competência da Justiça Comum, a tese oferece previsibilidade na condução da ação, permitindo uma atuação processual mais segura, fundamentada e alinhada à jurisprudência superior.
Aproveite e confira nosso artigo sobre Alienação Fiduciária: Como funciona e quais são as regras?
Impactos para advogados que atuam com usucapião
A decisão do STJ representa um marco importante na delimitação da competência jurisdicional em ações de usucapião, especialmente em contextos em que a posse se origina de relações de trabalho já encerradas.
Para advogados que atuam com regularização fundiária, litígios possessórios ou patrimoniais envolvendo antigos empregados ou prestadores de serviço, a tese fixada proporciona ganhos significativos em termos de estratégia processual, economia de recursos e segurança jurídica.
Principais impactos:
- Aumento da previsibilidade processual: o advogado pode ajuizar a ação diretamente na Justiça Comum, mesmo que a posse decorra de vínculo trabalhista encerrado, evitando dúvidas sobre a competência;
- Redução do risco de conflitos de competência: evita-se o retrabalho decorrente de declínios entre varas cíveis e trabalhistas, otimizando o andamento da ação desde o início;
- Fortalecimento do animus domini: reconhece-se que o fim do vínculo empregatício permite a consolidação da posse com ânimo de dono, o que é fundamental para o êxito da usucapião.
Usucapião com segurança: o que o STJ deixou claro para a advocacia
A recente decisão do STJ atua como um farol para os profissionais do Direito que lidam com ações possessórias em contextos complexos.
Ao afirmar que a Justiça Comum é competente para julgar ações de usucapião mesmo quando a posse teve origem em vínculo de trabalho já extinto, o tribunal elimina incertezas que geravam risco de nulidade e retrabalho processual.
Trata-se de um precedente que fortalece a segurança jurídica, delimita os campos de atuação da Justiça Comum e da Justiça do Trabalho e, sobretudo, oferece à advocacia um caminho mais claro e eficiente para conduzir esse tipo de demanda patrimonial.
A compreensão dessa linha de corte entre posse laboral e posse usucapível torna-se essencial para advogados que buscam decisões eficazes e processos bem fundamentados desde o início.
Referências:
https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo

Qual foi exatamente a tese firmada pelo STJ no julgamento do CC 211.941/PR?
O STJ fixou a seguinte tese:
“Compete à Justiça Comum Estadual (e não à Justiça do Trabalho) o julgamento de ação de usucapião de bem imóvel em que a posse exercida pela parte usucapiente supostamente decorre de vínculo empregatício já extinto à época do ajuizamento.”
Ou seja, se o contrato de trabalho já estiver encerrado no momento em que a ação de usucapião for ajuizada, a competência é da Justiça Comum Estadual.
Se a posse começou por causa do trabalho, o usucapião ainda é possível?
Sim. A decisão do STJ deixa claro que a origem da posse não impede a usucapião, desde que o vínculo de trabalho esteja encerrado no momento do ajuizamento e a parte exerça a posse com características usucapíveis (exclusividade, continuidade, animus domini e lapso temporal).
Por que o STJ entendeu que a Justiça do Trabalho não é competente nesses casos?
Porque, no usucapião, o que se discute é o domínio do imóvel — um direito real, de natureza civil, e não direitos trabalhistas.
Como não havia mais vínculo ativo entre as partes, nem pedidos relacionados à relação de emprego, não se justificava a atuação da Justiça do Trabalho.
Essa decisão vale para todos os casos de usucapião com vínculo trabalhista anterior?
Sim, desde que o vínculo empregatício esteja extinto antes do ajuizamento da ação de usucapião e não haja nenhuma discussão ativa sobre verbas trabalhistas ou natureza da posse no contexto do contrato.
O que muda na prática com essa decisão?
Advogados agora têm mais segurança jurídica para propor ações de usucapião na Justiça Comum, mesmo que a posse tenha nascido de uma relação trabalhista.
Isso evita nulidades, conflitos de competência e perda de tempo com discussões processuais desnecessárias