A Lei 15.040/2024 marca uma mudança importante para quem atua com Direito e mercado segurador no Brasil.
A lei reúne pontos que sempre geraram discussão como: dever de informação, formação do contrato, agravamento do risco, seguros de danos, responsabilidade civil e subrogação.
Nesse artigo vamos tratar dos principais elementos da lei, explicar como ela afeta seguradoras, corretores, advogados e segurados, e destacar onde estão as mudanças mais sensíveis para a prática jurídica.
Fique até o final e você terá uma visão clara do que muda e do que deve ser observado na adaptação ao novo marco!
O que trata a Lei nº 15.040/2024?
A Lei nº 15.040/2024 inaugura um ciclo diferente no mercado segurador brasileiro.
Ela organiza, de forma sistemática, temas que por anos foram definidos apenas por decreto-lei, circulares da Susep, construção doutrinária e entendimentos consolidados no STJ.
Advogados, seguradoras, corretores e reguladores precisam se preparar para uma adaptação, já que a lei foi promulgada em dezembro de 2024 e começará a valer em dezembro de 2025.
A lei funciona como uma espinha dorsal do contrato de seguro. Ela não aprofunda regras específicas de cada ramo, mas define a estrutura geral: obrigações recíprocas, deveres de informação, interpretação contratual, agravamento de risco, sinistro, regulação e liquidação.
Cada seguradora continuará responsável por adaptar as condições gerais, muitas vezes importadas de modelos estrangeiros e pouco ajustadas à prática brasileira, mas agora precisa fazer isso dentro de um marco jurídico mais claro.
Outro ponto de destaque é que a lei não rompe com a realidade digital. As discussões sobre tecnologia, proteção de dados e contratos eletrônicos continuam disciplinadas por normas como o Marco Civil da Internet, a LGPD, o Código de Defesa do Consumidor e a própria reforma do Código Civil.
A Lei 15.040/2024 convive com todas essas bases e se encaixa no que já existe, sem criar obstáculos.
Quais os objetivos centrais da Lei nº 15.040/2024?
1. Modernização do regime jurídico do contrato de seguro
A Lei nº 15.040/2024 chega com a intenção de modernizar o setor, substituindo a lógica fragmentada baseada em decreto-lei, circulares e jurisprudência.
Ela consolida entendimentos construídos ao longo de quase duas décadas e cria uma base mais estável para questões que antes dependiam exclusivamente de interpretação judicial.
2. Transparência e reforço do dever de informação
Um dos focos mais fortes do texto é o dever de informação, que passa a ter consequências para as duas partes: segurado e segurador.
A lei não trata a informação como um problema unilateral; reconhece que há responsabilidade técnica compartilhada.
3. Prevenção de práticas abusivas e fortalecimento do equilíbrio contratual
A influência do Código de Defesa do Consumidor é perceptível em vários dispositivos. Há uma tendência interpretativa próxima ao “em dúvida, pró-segurado”, resultado do peso que o legislador deu à proteção de quem contrata.
4. Promoção de segurança jurídica
A ausência de uma lei específica colocava o Brasil atrás de países da América Latina e da Europa, que há muitos anos contam com legislação própria para o setor.
A Lei nº 15.040/2024 busca corrigir essa lacuna, criando um marco mais previsível e diminuindo a dependência exclusiva da interpretação judicial.
5. Estímulo ao desenvolvimento de produtos adequados ao mercado
A lei incentiva que seguradoras abandonem soluções padronizadas que pouco conversam com as necessidades reais do segurado.
O setor agrícola é um exemplo claro: apesar de sua relevância econômica, permanece insuficientemente segurado.

A quem se aplica a Lei nº 15.040/2024?
O alcance da lei é amplo. Ela se dirige a todos os agentes que participam da cadeia do seguro: quem emite, distribui, contrata ou atua de alguma forma na relação securitária, seja garantindo riscos, seja integrando etapas da operação.
Por isso, seguradoras, resseguradores, corretores, intermediários, distribuidores e o próprio segurado devem observar as regras trazidas pelo novo diploma.
Seguradoras e resseguradores
Para as seguradoras, a lei reafirma que somente podem contratar seguros as entidades devidamente autorizadas a operar.
Questões relativas à constituição, governança, patrimônio líquido, estrutura de controle e demais requisitos continuam sob responsabilidade do regulador.
O mesmo raciocínio vale para os resseguradores. O ato constitutivo, o cadastramento anual, a classificação por tipo e os requisitos de manutenção no mercado permanecem na esfera regulatória.
A lei se volta sobretudo às cláusulas contratuais e aos efeitos práticos no relacionamento entre seguradoras e resseguradores.
Regulador de sinistro
Um ponto de destaque é o reconhecimento expresso do regulador de sinistro. Até então, não havia previsão clara em lei federal sobre essa figura.
O novo marco trata de sua remuneração, de suas responsabilidades e do seu lugar na cadeia securitária.
Intermediários e distribuidores
O conceito de intermediário permanece amplo. No cenário atual convivem, de forma estruturada, diferentes canais de distribuição: corretores, estipulantes e representantes de seguros.
No caso dos corretores, a lei própria continua vigente. Porém, o marco legal do seguro traz obrigações diretas, como a entrega de documentos ao destinatário em até cinco dias úteis, salvo situações que justifiquem prazo mais curto diante de iminente esclarecimento de direito.
Há também reflexos relacionados ao questionário de avaliação do risco, que exigirão ajustes na prática do corretor.
Assim, o corretor precisará compatibilizar as exigências da lei do corretor com as disposições do marco legal do seguro, fortalecendo seu papel como ponto relevante da cadeia.
Os estipulantes também receberam atenção específica: a lei define o estipulante do seguro coletivo como aquele que mantém vínculo prévio e neossecuritário com o grupo em benefício do qual o seguro é contratado. Sem esse vínculo, o seguro é considerado individual.
Aspectos contratuais da Lei nº 15.040/2024
Quando abordamos os aspectos contratuais da Lei de Seguros, a preocupação surge porque o texto legal utiliza, em alguns dispositivos, expressões como “modelo” e “modelo depositado pela seguradora”.
Essa terminologia remete ao sistema tradicional dos clausulados padronizados, aqueles depositados no regulador e recebem a já conhecida numeração.
No entanto, isso não significa um retorno ao modelo fechado.
A lei não proíbe a continuidade dos produtos estruturados na lógica da liberdade contratual conquistada nos últimos anos, especialmente após a consolidação da chamada nova era de produtos.
Quando o clausulado é depositado no regulador
A lei estabelece algumas regras específicas para os casos em que o clausulado é depositado. Nas situações em que houver referência ao modelo, as consequências são claras:
- O proponente deve ser cientificado previamente sobre o conteúdo do contrato, obrigatoriamente redigido em português.
- Se essa ciência prévia não ocorrer, prevalece a versão mais favorável ao proponente entre os modelos depositados.
Na prática, isso significa que, havendo vários produtos com a mesma numeração no sistema da SUSEP, e inexistindo referência expressa na proposta, o que valerá será o texto mais benéfico ao segurado.
Critérios de subscrição
A lei estabelece que os critérios comerciais e técnicos de subscrição devem promover a solidariedade e o desenvolvimento econômico-social, proibindo práticas discriminatórias ou que prejudiquem a livre iniciativa.
Formação e duração do contrato
A proposta de seguro continua podendo ser feita diretamente pelo segurado ou pelo corretor, e não exige forma escrita.
A lei apenas esclarece que o pedido de cotação não se confunde com a proposta, mas que todas as informações trocadas pelas partes e pelos intermediários integram o contrato.
Isso reforça, novamente, a relevância da atuação do corretor na etapa de formação contratual.
Recebida a proposta, a seguradora terá 25 dias para aceitar ou recusar justificadamente.
Prova do contrato e dever de informação
O contrato de seguro pode ser provado por todos os meios admitidos em direito, vedando-se apenas a prova exclusivamente testemunhal.
Além disso, a seguradora também deve alertar o segurado sobre as informações relevantes na fase pré-contratual.
As cláusulas que tratem de perda de direitos, exclusões, obrigações e restrições devem estar claras, compreensíveis e em destaque, sob pena de nulidade.
Boa-fé e a retirada da expressão “mais estrita boa-fé”
O contrato de seguro segue baseado na boa-fé, mas a lei não repetiu a expressão tradicional “mais estrita boa-fé”.
Isso não representa mudança na essência da relação securitária, mas revela uma opção redacional.
A boa-fé permanece como fundamento do vínculo, especialmente para diferenciar condutas dolosas e condutas culposas do segurado.
Agravamento do risco: uma nova definição
A lei também revisa o conceito de agravamento do risco, trazendo uma definição mais detalhada.
Considera-se relevante o agravamento que cause aumento significativo e continuado da probabilidade de ocorrência do risco descrito no questionário de avaliação, ou que aumente a severidade dos seus efeitos.
Esse conceito será essencial para a atuação da seguradora, para a orientação do segurado e, principalmente, para o papel do corretor no preenchimento do questionário de avaliação do risco, que passa a ser peça ainda mais estratégica.
Seguro de danos (Art.89 ao Art. 97 da Lei 15.040/24)
A lei dedica um capítulo específico aos seguros de danos, estruturado em três seções: disposições gerais, seguro de responsabilidade civil e transferência de interesse.
Seguro de danos e a novidade dos riscos de morte e integridade física com finalidade indenizatória
A lei traz uma inovação: os seguros que cobrem risco de morte ou perda da integridade física, desde que com finalidade indenizatória, passam a seguir, no que couber, as regras dos seguros de danos.
Um exemplo é o seguro prestamista, usado como garantia em financiamentos, empréstimos ou operações vinculadas a cartões de crédito.
Essa modalidade, embora destinada a pessoas, tem função essencialmente indenizatória, razão pela qual se enquadra nessa categoria excepcional.
Princípio indenitário
Nos seguros de danos, permanece a lógica do princípio indenitário:
a indenização não pode ultrapassar o valor da garantia.
Há ajustes relevantes na disciplina do rateio, especialmente em situações de:
- sinistro parcial;
- infrasseguro superveniente.
A lei também admite a contratação do seguro a valor de novo, mas, nesse caso, determina que não haja cláusula de rateio.
Cobertura de vícios
Outro ponto importante diz respeito aos vícios do bem segurado. A lei estabelece que:
- Não se presume a obrigação de indenizar vício não aparente e não declarado no momento da contratação, nem seus efeitos exclusivos;
- Se houver cobertura para vício, a garantia abrange os danos no bem em que o vício se manifesta e os danos decorrentes dele, salvo disposição contratual em sentido distinto.
Subrogação
A nova lei altera de forma expressiva a redação sobre a subrogação.
Enquanto o Código Civil, no Art. 786, fala em sub-rogação nos direitos e ações do segurado, a nova lei menciona apenas que a seguradora se sub-roga nos direitos pelas indenizações pagas nos seguros de danos.
A lei afirma, de forma clara, que o segurado deve colaborar no exercício dos direitos derivados da subrogação e responde pelos prejuízos que causar à seguradora.
O ponto em aberto é como comprovar esses prejuízos e como essa discussão será tratada judicialmente.
Outra disposição torna ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga a subrogação, reforçando a proteção à seguradora.
A lei também prevê que a subrogação não pode prejudicar o direito remanescente do segurado ou do beneficiário.
Na prática, isso dialoga com as situações em que a seguradora indeniza apenas parte do prejuízo – por exemplo, quando o limite da apólice é inferior ao dano total.
Nesses casos, segurado e seguradora costumam alinhar seus interesses contra o causador do dano, e a lei reconhece essa dinâmica de forma explícita.
Seguros de Responsabilidade Civil (Art. 98 ao Art.107 da Lei 15.040/24)
A lei do contrato de seguro dedica uma seção própria aos seguros de responsabilidade civil (RC).
Embora exista a separação geral entre seguros de danos e seguros sobre a vida e a integridade física, apenas o seguro de responsabilidade civil recebe tratamento individualizado dentro da parte que trata de danos.
Ou seja, o legislador não criou seções específicas para outros ram. O único destaque dentro dos seguros de danos é justamente o RC, que aparece em aproximadamente dez artigos.
1. Conceituação e estrutura do seguro de responsabilidade civil
A lei começa trazendo uma definição. O seguro de RC é caracterizado como aquele que garante o interesse do segurado contra os efeitos da imputação de responsabilidade e do seu reconhecimento, bem como o interesse dos terceiros prejudicados à indenização.
A redação chama atenção por dois motivos:
- A primeira parte tutela o patrimônio do segurado, como tradicionalmente ocorre no RC.
- A segunda parte menciona diretamente o interesse dos prejudicados, reforçando o papel da vítima na dinâmica do seguro.
A lei também admite que o limite máximo de garantia pode ser consumido por apenas um terceiro prejudicado ou por poucos prejudicados, sem necessidade de rateio prévio entre todos os envolvidos.
2. Gastos com defesa
Outro ponto importante é o tratamento específico dado aos custos de defesa.
Segundo o texto legal, deve existir um limite autônomo para essa cobertura, separado do limite destinado à indenização dos prejudicados.
3. Deveres de colaboração do segurado (ou responsável garantido)
A lei utiliza a expressão responsável garantido pelo seguro, que deve ser lida como o próprio segurado. A ele são atribuídas diversas obrigações de colaboração, tais como:
- Encaminhar à seguradora qualquer comunicação recebida que possa originar uma reclamação futura;
- Fornecer documentos solicitados;
- Comparecer aos atos processuais para os quais for intimado;
- Não praticar atos que prejudiquem os direitos da seguradora.
O descumprimento dessas obrigações pode gerar responsabilidade pelos prejuízos causados à seguradora, embora permaneça a questão prática de como esses prejuízos serão demonstrados.
4. A relação entre a vítima e a seguradora
A lei trata dessa relação em três frentes:
a) A vítima pode exercer sua pretensão exclusivamente contra o segurado.
Nessa situação, o segurado precisa comunicar o fato à seguradora.
b) Criação de um novo instituto processual:
O segurado pode chamar a seguradora ao processo, sem solidariedade.
c) Ação direta da vítima contra a seguradora:
O texto acolhe a ação direta, mas condicionada à formação de litisconsórcio passivo com o segurado, em linha com a Súmula 529 do STJ.
5. Acordos e transações
Ao contrário do Código Civil, que exige anuência da seguradora para acordos firmados pelo segurado com terceiros, a nova lei não repete essa regra.
O que ela estabelece é que a seguradora pode realizar acordos diretamente com os prejudicados, sem que isso implique reconhecimento de responsabilidade do segurado ou prejudiquem aqueles a quem se atribui essa responsabilidade.
6. Dever de divulgar a existência do seguro
Talvez o ponto mais inovador da seção esteja aqui.
A lei determina que o segurado empreenda esforços para informar os terceiros prejudicados sobre a existência do seguro contratado.
E vai além: se houver vários prejudicados e a seguradora não tiver conhecimento da existência de todos, ela se libera ao pagar o limite garantido a um ou mais deles.
Seguro sobre a vida e a Integridade Física (Art. 112 ao Art. 124, Lei 15.040/24)
Os seguros sobre a vida e a integridade física passaram por uma reorganização conceitual na nova lei de seguros: seguros de danos e seguros sobre a vida e a integridade física.
Essa alteração não muda apenas a nomenclatura; ela realinha a forma como o mercado deve interpretar coberturas relacionadas à morte, invalidez e demais riscos ligados à existência humana.
Esses eventos passam a ser compreendidos dentro de uma seção específica da lei, voltada à proteção da vida e da integridade física.
A figura do beneficiário
O beneficiário, peça central nesse tipo de seguro, foi disciplinado de maneira mais detalhada. A lei reafirma a liberdade de indicação, mas avança ao tratar de situações específicas, como a comoriência.
A comoriência ocorre quando segurado e beneficiário falecem no mesmo evento e não é possível determinar quem morreu primeiro. Nessas hipóteses, a indicação do beneficiário é considerada ineficaz, o que a lei expressa ao afirmar que a indicação não prevalece se o beneficiário falecer antes do sinistro ou em caso de comoriência.
Quando não houver beneficiário válido ou quando a indicação não prevalecer, a lei estabelece que o capital segurado (ou a reserva matemática, conforme o caso) será distribuído da seguinte forma:
- metade ao cônjuge, se houver;
- o restante aos demais herdeiros do segurado.
Essa solução corrige dúvidas interpretativas do Código Civil, já que deixava margem para discussões sobre a posição do cônjuge no concurso sucessório, dependendo do regime de bens.
Se não houver beneficiários indicados, herdeiros ou dependentes, o valor será entregue a quem provar que a morte do segurado retirou seus meios de subsistência, regra que segue o que já era previsto no sistema atual.
O aporte ao Fundo Nacional para Calamidades
Outra inovação que tem ganhado destaque é a previsão de que, se o capital segurado não for reclamado dentro do prazo prescricional, ele será destinado ao Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (CAP).
Esse dispositivo, incluído na fase final da tramitação no Senado, gera três pontos imediatos de debate:
- Ônus de identificação do beneficiário;
- Funcionamento do fundo;
- Critério temporal de aplicação;
Em termos práticos, a ideia é estimular a indicação prévia de beneficiários, reduzindo casos de valores não reclamados.
Capital segurado não é herança
A lei reafirma que o capital segurado devido por morte não integra a herança, mantendo o entendimento já consolidado. Trata-se de verba autônoma, destinada diretamente ao beneficiário.
Também se estabelece que se equipara ao seguro de vida a garantia de morte prevista nos planos de previdência complementar.
Carência
A carência é permitida, mas com uma ressalva importante: não pode ser aplicada nos casos de renovação ou substituição de contrato existente, ainda que o novo contrato seja celebrado com outra seguradora.
Se o sinistro ocorrer durante o prazo de carência, a seguradora deve devolver o prêmio pago ou a reserva matemática, quando houver.
Regulação e Liquidação de sinistros (Art. 75 ao Art. 88 da Lei do Contrato de Seguros)
Esse tópico também chama bastante atenção, isso porque, o Código Civil praticamente não tratava desse assunto, enquanto a nova lei dedica alguns artigos exclusivamente a ele, inaugurando um regime jurídico próprio e detalhado.
O primeiro ponto importante é que permanece inexistente um prazo máximo para comunicação do sinistro. Assim como no Código Civil, a lei utiliza expressões abertas.
Antes falávamos em “logo que saiba”; agora, o termo escolhido foi “prontamente”.
Essa alteração, à primeira vista singela, tem impacto direto no tema da prescrição, pois o prazo prescricional passa a fluir da data da recusa da indenização e não mais da data do sinistro.
Se o segurado demora a comunicar e esse atraso impede a caracterização do aviso “prontamente”, poderíamos chegar a situações delicadas envolvendo prazos indefinidos, algo que o legislador evidentemente não buscou.
Para lidar com isso, a lei cria uma dinâmica própria de consequências pelo descumprimento do dever de avisar prontamente, distinguindo duas hipóteses:
- Dolo: leva à perda da garantia.
- Culpa: gera perda do direito à indenização pelos danos decorrentes da omissão.
Há ainda outra novidade relevante: mesmo que o segurado não comunique o sinistro no prazo adequado, a consequência não se aplica se ele demonstrar que a seguradora teve ciência do sinistro por outros meios.
Atribuições da seguradora
A lei também reforça que a regulação e a liquidação são atribuições da seguradora, o que coloca a seguradora como responsável direta pela análise e conclusão da regulação.
Um trecho que tem gerado atenção é a exigência de que regulação e liquidação sejam simultâneas sempre que possível.
Outro aspecto protetivo ao segurado é a regra segundo a qual dúvidas sobre critérios e fórmulas de cálculo devem ser resolvidas em favor do segurado.
Além disso, documentos e relatórios considerados comuns às partes devem ser compartilhados, exceto quando protegidos por confidencialidade.
Prazos para recusa e para liquidação
Um dos avanços mais discutidos da lei é a fixação de prazos máximos para a regulação e a liquidação.
A regra geral é de 30 dias, aplicável à maior parte dos contratos, como automóvel, vida e integridade física, e seguros cujo capital segurado seja igual ou inferior a 500 salários mínimos.
Para sinistros considerados mais complexos, esse prazo pode chegar a 120 dias. Aqui está a única parte da lei em que o legislador cria um ponto de distinção entre tipos de seguros, mas sem utilizar a nomenclatura clássica de grandes riscos versus massificados.
A ideia é observar complexidade, e não apenas valor. Assim, um seguro com capital inferior a 500 salários mínimos pode ter regulação mais complexa que outro de valor elevado.
A lei também estabelece regras sobre solicitação de documentos durante a regulação:
- Regra geral: um único pedido de documentos.
- Quando o capital segurado for superior a 500 salários mínimos, podem ser feitos dois pedidos, com suspensão dos prazos.
Prescrição (Art. 126 ao Art. 127, Lei 15.040/24)
O prazo geral continua sendo de um ano, mas a lei altera o marco inicial da contagem.
Enquanto o Código Civil utilizava a expressão “fato gerador”, a nova lei estabelece de forma expressa que o prazo passa a correr a partir da ciência da recusa expressa e motivada da seguradora.
Essa mudança dialoga diretamente a importância de o segurado avisar prontamente a seguradora acerca do sinistro.
Sem esse aviso imediato, poderíamos cair em situações extremas, com pretensões que nunca prescreveriam. Isso impactaria não só o equilíbrio das relações contratuais, mas também provisionamento, reserva técnica e gestão de riscos pelas seguradoras.
Prazos de beneficiários e terceiros
Para os beneficiários e terceiros prejudicados, a lei estabelece um prazo de três anos, contado da ciência do fato gerador. Aqui, ao contrário do que ocorre com o segurado, o legislador manteve a expressão tradicional.
Isso significa que a discussão sobre o que seja exatamente esse fato gerador deve continuar, especialmente em cenários em que o beneficiário ou o terceiro participam da regulação ou apresentam pedido direto à seguradora.
Revogações parciais e dúvidas interpretativas
Embora a lei revogue integralmente os dispositivos do Código Civil relacionados à prescrição securitária, deixou de fora o art. 206, § 3º, inciso 9, que prevê prazo de três anos para o beneficiário e para o terceiro prejudicado nos seguros obrigatórios de responsabilidade civil.
Além disso, a revogação atingiu o prazo de um ano para ações envolvendo seguros de RC facultativo, antes contado da data da citação do segurado ou do pagamento feito com anuência da seguradora.
A nova lei, ao usar novamente a expressão fato gerador, tende a provocar controvérsias sobre o marco inicial nessas hipóteses, considerando que muitos sinistros de responsabilidade civil são regulados durante o próprio processo judicial.
Prazos de um ano para outras pretensões
A lei também uniformiza o prazo de um ano para outras situações, tais como:
- Cobrança do prêmio pela seguradora;
- Pretensão da seguradora contra o segurado ou estipulante;
- Cobrança de remuneração por parte dos intervenientes (corretores, agentes, representantes e estipulantes);
- Pretensões entre conseguradoras;
- Pretensões entre seguradoras, resseguradoras e retrocessionárias.
Aspectos processuais da Lei n.º 15.040/2024
Vamos compreender melhor os aspectos processuais que essa lei modifica:
1. Foro competente (Art. 131)
O primeiro ponto é a regra de competência. A lei determina que as ações relativas ao contrato de seguro devem ser ajuizadas no foro do domicílio do segurado ou do beneficiário, salvo se esses optarem pelo domicílio da seguradora ou de seu agente.
Além disso, afirma a competência absoluta da justiça brasileira para resolver litígios envolvendo contratos de seguro sujeitos à lei.
A lei estabelece que a resolução alternativa deve:
- Ocorrer no Brasil;
- Seguir exclusivamente as regras de direito brasileiro;
- Ser pactuada em instrumento assinado pelas partes.
E ainda prevê que a SUSEP disciplinará a divulgação obrigatória de conflitos e decisões.
2. Interferência na arbitragem
A lei determina que seguradoras, resseguradoras e retrocessionárias – inclusive aquelas sem estabelecimento no Brasil – devem responder no foro do domicílio no Brasil em arbitragens e ações que discutam questões capazes de interferir em contratos de seguro regidos pela lei.
Isso alcança players estrangeiros:
- Resseguradores admitidos, representados por escritórios locais;
- Resseguradores eventuais, que muitas vezes contam apenas com um representante legal;
- Retrocessionários que, em vários casos, não têm qualquer presença no país.
3. Disposições específicas por ramo: criação de um microsistema processual
A lei não se limita a princípios gerais. Ela cria, na prática, um microssistema processual para alguns ramos de seguro. Vamos aos principais:
Seguro de vida
O contrato de seguro de vida passa a ser título executivo extrajudicial (Art. 132 da Lei 15.040/24).
Cobrança do prêmio
A lei também altera a dinâmica da cobrança de prêmio: a seguradora só pode cobrar depois de notificar o segurado e não obter pagamento.
Isso tem efeito imediato em ramos como seguro-garantia, nos quais o não pagamento do prêmio pode ser, em certas situações, irrelevante para o segurado, além de interferir na própria lógica da exceção do prêmio.
Responsabilidade civil: fim da denunciação da lide
No seguro de responsabilidade civil, a lei altera profundamente a dinâmica processual ao:
- Eliminar a denunciação da lide;
- Criar um chamamento ao processo sem solidariedade.
No CPC, o chamamento ao processo pressupõe solidariedade entre os chamados. Aqui, o legislador cria um instituto próprio: o segurado chama a seguradora para a lide, mas sem que isso gere solidariedade.
Por que a Lei 15.040/2024 muda o jogo no contrato de seguro
Percebeu como a Lei 15.040/2024 tem potencial para mudar a forma como lidamos com contratos de seguro no Brasil?
O texto reorganiza conceitos, cria responsabilidades claras e reposiciona o papel de cada agente da cadeia securitária, o que exige atenção de quem atua na área.
Agora que você conhece os principais pontos, fica mais fácil identificar onde estão as mudanças práticas e o que deve ser ajustado no dia a dia profissional.



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