O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 18 de setembro de 2025, consolidar os critérios que obrigam os planos de saúde a custear tratamentos e procedimentos não previstos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Embora o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já tivesse admitido, em 2022, a chamada tese do rol taxativo mitigado, a nova decisão do STF, tomada no julgamento da ADI 7265 e relatada pelo ministro Luís Roberto Barroso, confere efeito vinculante e uniformiza a interpretação em todo o país

O que foi consolidado pelo STF?
O Supremo Tribunal Federal confirmou que o rol da ANS é a referência mínima obrigatória para a cobertura dos planos de saúde, mas não pode ser interpretado de forma absolutamente taxativa.
Na ADI 7265, prevaleceu a posição do presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, que propôs a adoção de cinco critérios cumulativos para que os planos de saúde sejam obrigados a custear tratamentos não previstos no rol da ANS;
São eles:
- Prescrição do tratamento por médico ou odontólogo assistente habilitado;
- Inexistência de negativa expressa da ANS ou de pendência de análise em proposta de atualização do rol;
- Ausência de alternativa terapêutica adequada já disponível no rol da ANS;
- Comprovação de eficácia e segurança do tratamento à luz da medicina baseada em evidências, respaldada por estudos científicos de alto nível;
- Registro na Anvisa do medicamento, procedimento ou tecnologia em questão.
Com esses parâmetros, o STF consolida a tese do rol taxativo mitigado, mas com balizas mais objetivas, conferindo efeito vinculante e uniformidade para todo o Judiciário. Na fundamentação da decisão, o STF destacou:
“1. É constitucional a imposição de cobertura de tratamentos ou procedimentos fora do rol da ANS, desde que preenchidos os parâmetros técnicos e jurídicos fixados nesta decisão.
2. Em caso de tratamento ou procedimentos não previstos no rol da ANS, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que preenchidos cumulativamente os seguintes requisitos.
(i) Prescrição por médico ou odontólogo assistente habilitado;
(ii) Inexistência de negativa expressa da ANS ou de pendência de análise em proposta de atualização do rol.
(iii) Ausência de alternativa terapêutica adequada para a condição do paciente no rol de procedimentos da ANS.
(iv) Comprovação de eficácia e segurança do tratamento à luz da medicina baseada em evidências de alto grau ou ATS, necessariamente respaldadas por evidências científicas de alto nível.
(v) Existência de registro na Anvisa.
3. A ausência de inclusão de procedimento ou tratamento no rol da ANS impede, como regra geral, a sua concessão judicial, salvo quando preenchidos os requisitos previstos no rol.
4. Sob pena de nulidade da decisão judicial, nos termos do art. 489, § 1º, 5 e 6 e art. 927, 3 e § 1º do CPC, o Poder Judiciário, ao apreciar o pedido de cobertura de procedimento ou tratamento não incluído no rol, deverá obrigatoriamente:
a. Verificar se há prova do prévio requerimento à operadora de saúde, com a negativa, mora irrazoável ou omissão da operadora na autorização do tratamento não incorporado ao rol da ANS.
b. Analisar o ato administrativo de não incorporação pela ANS à luz das circunstâncias do caso concreto e da legislação de regência, sem incursão no mérito técnico-administrativo.
c. Aferir a presença dos requisitos previstos no item 2, a partir de consulta prévia ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS), sempre que disponível, ou a entes ou pessoas com expertise técnica, não podendo fundamentar a sua decisão apenas em prescrição, relatório ou laudo médico apresentado pela parte.
d. Em caso de deferimento judicial do pedido, oficiar a ANS para avaliar a possibilidade de inclusão do tratamento no rol de cobertura obrigatória.”
Veja aqui a íntegra da decisão do STF da ADI 7265.
Histórico da discussão
Em 08/06/2022, durante o julgamento do EREsp 1.886.929-SP, o STJ havia consolidado o entendimento de que o rol da ANS possui caráter taxativo.
A decisão reconheceu que é possível contratar coberturas adicionais ou firmar aditivos contratuais para incluir procedimentos que excedam o rol da ANS. Esse posicionamento gerou forte reação social, diante do risco de pacientes ficarem sem acesso a terapias necessárias.
Em resposta, o Congresso Nacional aprovou a Lei 14.454/2022, alterando a Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998) para afirmar que o rol da ANS deveria ser considerado como exemplificativo, isto é, uma referência mínima, permitindo a cobertura de tratamentos fora da lista desde que comprovada a eficácia e preenchidos requisitos legais.
A mudança legislativa foi contestada no Supremo Tribunal Federal (STF), pela Unidas (União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde), por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7265.
A entidade alegava que a lei ampliava indevidamente as obrigações das operadoras, comprometendo o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos e gerando insegurança jurídica.
Esse embate resultou no julgamento de setembro de 2025, em que o STF confirmou a constitucionalidade da lei, mas delimitou critérios objetivos para a cobertura de procedimentos fora do rol da ANS, estabelecendo parâmetros vinculantes para todo o Judiciário.
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O que os tribunais decidiam antes
Antes da definição pelo STF, havia um cenário de insegurança jurídica. O STJ, em 2022, já havia flexibilizado a rigidez do rol ao reconhecer o chamado rol taxativo mitigado. Essa fórmula permitia que, em situações específicas, como a comprovação científica de eficácia do tratamento ou inexistência de alternativa disponível no rol, os pacientes obtivessem a cobertura judicialmente.
O problema é que, por se tratar de uma decisão sem efeito vinculante, juízes e tribunais aplicavam o entendimento de forma desigual. Enquanto alguns acolhiam amplamente pedidos de cobertura, outros restringiam o alcance da tese, o que resultava em decisões contraditórias e, muitas vezes, demorava a garantir acesso ao tratamento.
Foi justamente essa fragmentação de entendimentos que levou à edição da Lei 14.454/2022 e, posteriormente, à provocação do STF pela ADI 7265, culminando na uniformização definitiva da matéria.
Impactos práticos da decisão e reflexos na advocacia suplementar
Com o julgamento da ADI 7265, o Supremo Tribunal Federal consolidou que o rol da ANS deve ser interpretado como referência mínima, e não como limite absoluto.
Ao conferir efeito vinculante à decisão, o STF encerra a fragmentação de entendimentos nos tribunais e estabelece parâmetros objetivos que devem ser observados em todo o país.
Essa uniformização gera efeitos diretos na prática advocatícia:
- Maior previsibilidade em ações judiciais: petições podem ser construídas de forma mais estratégica, demonstrando objetivamente o cumprimento dos cinco critérios;
- Atuação preventiva: escritórios podem auxiliar clientes já na fase administrativa, orientando a documentação necessária para fundamentar pedidos de cobertura.
- Redução da litigiosidade desigual: com parâmetros vinculantes, diminui a chance de decisões contraditórias em casos semelhantes, o que fortalece a advocacia especializada;
- Novas oportunidades de atuação: tanto na defesa dos beneficiários, em pedidos de cobertura e indenização por negativa abusiva, quanto no assessoramento de operadoras, que precisarão ajustar protocolos internos à decisão.
Em síntese, a decisão do STF equilibra direitos e deveres no setor de saúde suplementar e cria um campo de atuação mais sólido para a advocacia, que agora dispõe de critérios claros e vinculantes para sustentar suas teses.

O que o STF decidiu sobre os planos de saúde e o rol da ANS?
O STF decidiu que o rol da ANS deve ser interpretado como referência mínima, e não como limite absoluto. Assim, planos de saúde podem ser obrigados a custear tratamentos fora da lista, desde que preenchidos critérios definidos pela Corte.
Quais são os critérios fixados pelo STF para cobertura de tratamentos fora do rol?
São cinco: prescrição médica ou odontológica; inexistência de negativa ou análise pendente pela ANS; ausência de alternativa eficaz no rol; comprovação científica de eficácia e segurança; e registro na Anvisa.
O que muda na prática para os beneficiários de planos de saúde?
Os beneficiários passam a ter mais segurança jurídica para exigir tratamentos fora do rol, desde que comprovem o atendimento dos requisitos fixados pelo STF.
Como essa decisão impacta a atuação da advocacia em saúde suplementar?
Os advogados passam a contar com parâmetros claros e vinculantes, o que fortalece a argumentação em ações judiciais e também a atuação preventiva na fase administrativa.
Essa decisão do STF revoga a Lei 14.454/2022?
Não. O STF confirmou a constitucionalidade da lei, mas delimitou o seu alcance, fixando critérios objetivos para a cobertura fora do rol.
Os planos de saúde ainda podem negar cobertura de procedimentos não listados pela ANS?
Sim, desde que o tratamento não atenda cumulativamente aos critérios definidos pelo STF. Nesses casos, a negativa será considerada legítima.
O entendimento do STF vale para todo o país?
Sim. Por ter efeito vinculante, a decisão deve ser seguida por todos os tribunais e juízes do Brasil, evitando decisões contraditórias.