A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a sucessão processual de sociedade empresária por seus sócios só pode ocorrer mediante prova efetiva da dissolução e da extinção da personalidade jurídica.
O julgamento afasta a tese de que a condição de CNPJ inapto ou a simples mudança de endereço da empresa bastariam para justificar a substituição da pessoa jurídica pelos sócios no polo passivo da demanda.

Qual foi o entendimento do STJ?
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou que a sucessão processual, o qual equivale à morte de uma pessoa física, só pode ser reconhecida, no caso de sociedade empresária, quando houver prova da dissolução e da extinção da personalidade jurídica.
O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, destacou que a condição de CNPJ inapto decorre de situações administrativas, como falta de entrega de declarações fiscais ou ausência no endereço cadastrado, e não significa extinção da empresa.
Da mesma forma, a mera mudança de endereço não implica perda da personalidade jurídica.
Com esse entendimento, o STJ reforça que a sucessão só se aplica quando há a extinção formal da sociedade, e não em hipóteses de irregularidades administrativas ou de localização.
Ementa:
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. SUCESSÃO PROCESSUAL. DISSOLUÇÃO REGULAR. PESSOA JURÍDICA. NÃO COMPROVAÇÃO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A controvérsia dos autos resume-se em definir se na hipótese era possível determinar a sucessão processual da pessoa jurídica. 2. A jurisprudência desta Corte admite a sucessão processual de sociedade empresária por seus sócios em caso de perda de sua personalidade jurídica, situação equiparada à morte da pessoa física. 3. A mudança de endereço ou a condição de “inapta” no CNPJ não comprovam a dissolução da sociedade, pois não implicam a perda da personalidade jurídica. 4. A sucessão processual de sociedade empresária por seus sócios requer a existência de prova da dissolução e da extinção da personalidade jurídica. 5. Recurso conhecido e não provido.
Leia aqui a íntegra do Acórdão
Contexto fático
O caso teve origem em uma ação em que a parte credora buscava a sucessão processual de uma sociedade empresária por seus sócios, sob o argumento de que a empresa não estava mais localizada em seu endereço cadastrado e encontrava-se com o CNPJ na situação de inapto perante a Receita Federal.
O tribunal de origem havia aceitado esses elementos como indícios suficientes de que a sociedade estaria extinta, autorizando a substituição da pessoa jurídica pelos sócios no polo passivo da demanda.
Ao analisar o recurso especial, a 3ª Turma do STJ reformou esse entendimento. Para o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, nem a anotação de inaptidão no CNPJ nem a mudança de endereço configuram prova de dissolução da sociedade, uma vez que tais situações são de natureza meramente administrativa e podem ser regularizadas a qualquer tempo.
Com isso, o STJ deixou claro que a sucessão processual só pode ocorrer quando demonstrada de forma inequívoca a dissolução e a extinção da personalidade jurídica, seja de forma regular ou irregular, mas sempre mediante comprovação concreta.
Base legal
A decisão do STJ encontra fundamento direto no Código de Processo Civil de 2015, que regula a sucessão processual.
- Art. 110 do CPC: Prevê que, ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a sucessão pelo seu espólio ou pelos sucessores, salvo disposição em contrário.
- Aplicação analógica às pessoas jurídicas: No caso de sociedades empresárias, a sucessão só é possível quando há a extinção da personalidade jurídica, equiparada à morte da pessoa natural.
O Tribunal também ressaltou a diferença entre sucessão processual e desconsideração da personalidade jurídica:
- Na sucessão processual, exige-se a comprovação da dissolução e extinção da sociedade, que perde sua capacidade de estar em juízo.
- Na desconsideração, os sócios podem responder por obrigações da empresa sem que haja a sua extinção, desde que caracterizados abuso de personalidade, desvio de finalidade ou confusão patrimonial (art. 50 do CC).
Assim, a mera condição de CNPJ inapto ou a mudança de endereço não têm força jurídica para extinguir a personalidade da sociedade, não autorizando a sucessão automática pelos sócios.

Consequências práticas do entendimento do STJ
O posicionamento do STJ traz efeitos imediatos para a prática da advocacia, sobretudo em execuções e demandas que envolvem sociedades empresárias.
Ao exigir prova concreta da dissolução e da extinção da personalidade jurídica para admitir a sucessão processual, a Corte Superior afasta a presunção da extinção da sociedade com base apenas na condição de CNPJ inapto ou na não localização da empresa em seu endereço cadastrado.
Na prática, essa decisão significa que credores não podem mais utilizar meros indícios administrativos para redirecionar a demanda contra os sócios, impondo a necessidade de instrução probatória robusta.
Do outro lado, a advocacia de defesa ganha um argumento sólido para impedir que sócios sejam chamados ao processo sem que haja efetiva comprovação da dissolução societária.
Portanto, o precedente cria um novo marco de segurança jurídica: impede interpretações amplas que fragilizem a autonomia patrimonial das sociedades e, ao mesmo tempo, delimita de forma mais clara os instrumentos processuais que podem ser utilizados por credores e devedores.
Estratégias processuais diante do precedente
A decisão do STJ traça caminhos distintos para credores e devedores em litígios envolvendo sociedades empresárias:
- Credores: Passa a ser imprescindível reunir elementos concretos que comprovem a efetiva dissolução da sociedade. Certidões da Junta Comercial, comprovação da baixa no CNPJ ou documentação que demonstre a extinção irregular (como encerramento de atividades e inexistência de patrimônio) são meios de prova necessários. Sem essa instrução robusta, o pedido de sucessão processual dificilmente prosperará.
- Devedores/sócios: O precedente oferece um fundamento sólido para resistir à inclusão automática no polo passivo. A defesa pode sustentar que situações meramente administrativas, como a condição de CNPJ inapto ou a simples mudança de endereço, não configuram extinção da pessoa jurídica, devendo o pedido ser rejeitado com base na orientação do STJ.
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Reforço à autonomia patrimonial da pessoa jurídica
O entendimento do STJ reafirma o princípio da separação entre o patrimônio da sociedade e o de seus sócios, núcleo central da autonomia patrimonial.
Ao exigir prova inequívoca da extinção da sociedade para admitir a sucessão processual, a Corte Superior impede que irregularidades cadastrais ou meras dificuldades de localização sirvam como atalhos para atingir diretamente os bens particulares dos sócios.
Esse posicionamento fortalece a previsibilidade nas relações empresariais, assegura maior estabilidade às sociedades e garante que o redirecionamento de responsabilidades aos sócios só ocorra em hipóteses expressamente previstas em lei.
Além de preservar a lógica societária, o precedente serve como alerta para os credores: não basta apontar indícios administrativos de irregularidade, como o CNPJ inapto, para alcançar o patrimônio dos sócios.
É preciso respeitar o devido processo legal e os limites da autonomia da pessoa jurídica, sob pena de se instaurar insegurança nas relações empresariais e desestimular a atividade econômica.
Para os advogados de defesa, o julgado do STJ passa a ser um instrumento estratégico de primeira ordem.
Em situações de execução ou cobrança judicial, pode-se invocar o precedente como barreira contra tentativas de redirecionamento automático da demanda, reforçando que apenas a dissolução formal ou a comprovação inequívoca da extinção da sociedade autorizam a sucessão processual.

O que o STJ decidiu sobre a sucessão processual de sociedades empresárias?
O STJ firmou que a sucessão processual só ocorre quando há prova da dissolução e da extinção da personalidade jurídica da sociedade. A simples condição de CNPJ inapto ou a mudança de endereço não autorizam a sucessão.
A anotação de “inapta” no CNPJ significa extinção da empresa?
Não. Trata-se de medida administrativa aplicada pela Receita Federal por descumprimento de obrigações, mas que pode ser regularizada a qualquer momento. Portanto, não equivale à dissolução societária.
Quando é possível ocorrer a sucessão processual de uma sociedade por seus sócios?
Apenas quando houver prova inequívoca da dissolução da pessoa jurídica, seja por extinção regular (baixa formal) ou irregular (comprovada pelo encerramento de fato das atividades).
Qual a diferença entre sucessão processual e desconsideração da personalidade jurídica?
Na sucessão, exige-se a extinção da sociedade, que perde capacidade de estar em juízo. Já na desconsideração, os sócios podem ser responsabilizados mesmo com a empresa em atividade, desde que haja abuso de personalidade, desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
Quais provas são aceitas para demonstrar a dissolução da sociedade?
Certidão da Junta Comercial, comprovação de baixa no CNPJ ou documentos que mostrem o encerramento irregular das atividades. Simples extratos de CNPJ “inapto” ou ausência no endereço cadastrado não bastam.
Quais são as consequências práticas desse precedente para os credores?
Credores precisam instruir seus pedidos com provas concretas de extinção da empresa. Alegações baseadas apenas em irregularidades administrativas não serão aceitas.
Como os sócios podem se defender diante de pedidos de sucessão processual?
Podem invocar o precedente do STJ para sustentar que meras irregularidades cadastrais não autorizam a sucessão, exigindo do credor a comprovação efetiva da dissolução societária.